A Era de Ouro se perde em filme familiar “chapa branca” e não capta a essência dos anos 80
No jornalismo, a expressão “chapa branca” indica que um veículo ou jornalista publica apenas aquilo que um governo ou seus superiores querem, sem questionar nada. O filme A Era de Ouro, em certa medida, sofre desse mal e, além de não captar a essência dos anos 80, cria uma versão branda de um homem cujo impacto na indústria musical é inegável.
A Era de Ouro é escrito, dirigido e produzido por Timothy Scott Bogart (Verdade e Honra), filho de Neil Bogart, produtor musical que ajudou a fundar a Casablanca Records e lançou ao estrelato nomes como Village People, Kiss e Donna Summer. Talvez por isso, a produção ganha um viés de homenagem e idolatria que, em muitos momentos, não combina com o que vemos na tela.
A Era de Ouro e a máquina de sucessos
Inegavelmente, há relevância em contar a história de Neil Bogart nos cinemas. Com um dom para encontrar e produzir talentos musicais, ele foi responsável por sacudir o mercado fonográfico nos anos 70 e 80, confrontando grandes gravadoras e criando estratégias de marketing e divulgação que, até então, eram inéditas.
A questão é a forma como Bogart atravessa a sua história. Vivido por Jeremy Jordan (Os Últimos 5 Anos), o produtor é visto como um gênio praticamente sem imperfeições em sua juventude. Casado com Beth Bogart (Michelle Monaghan), eles suportam um ao outro de maneira tão “perfeita” que mais parecem saídos de um comercial de margarina. Nem mesmo um caso extraconjugal é mostrado como algo sem tanta importância.
Jordan, aliás, não convence dessa vez no papel. Por escolha própria ou orientação do diretor, o fato é que ele coloca Bogart como um gênio, incapaz de aceitar derrotas ou revezes, mas que não se abate, nem mesmo de forma mínima quando isso acontece. Novamente, não soa verossímil tamanho “equilíbrio”, por assim dizer, tanto que as “explosões” cabem sempre a alguns de seus amigos.
A essência dos anos 80 ficou de fora
Se em A Era de Ouro o aspecto familiar parece influir em um Neil Bogart praticamente unidimensional, ainda mais incômodo é ver as performances e personificações de algumas estrelas da música que passaram pelo selo Casablanca.
Donna Summer (Tayla Parx) é retratada como uma mulher insegura, frágil e inexpressiva. Já a banda Kiss, conhecida por sua magnífica presença de palco, faz apresentações tímidas e que nem de longe lembram a energia do grupo liderado por Gene Simmons (aqui, interpretado sem brilho por Casey Likes).
Ainda que Bogart tenha a sua parcela de mérito, ele não é a estrela principal como aparenta ser. Entretanto, os artistas, em sua maioria, são retratados como meras “marionetes” em suas mãos, dando a entender que, apesar do talento, eles não seriam nada sem o “toque de Midas” do nada modesto produtor.
Tem história para contar
Falta empolgação e A Era de Ouro nunca “acontece”. Mesmo os pontos que deveriam ser um clímax – derrotar uma grande gravadora, fazer com que um artista alcance o sucesso – tudo é visto de forma relativamente “fria”, com Bogart colhendo os louros pelo trabalho.
Aliás, a maneira escolhida pelo diretor para contar a história, como se Neil Bogart a narrasse para um repórter ou documentarista, é um tanto quanto presunçosa. Por sua personalidade, o diretor dá a entender que o pai era realmente assim. O problema é que essa escolha o torna, de certa forma, insuportável em alguns momentos para o público.
Não se trata de verossimilhança ou contar a verdade, mas algumas histórias contadas claramente não funcionam como são propostas – a sequência no hotel, da primeira apresentação do Kiss, é um bom exemplo de uma entre tantas que não funciona bem. O que é uma pena, pois o período e as histórias envolvidas aparentemente têm uma riqueza que vai muito além dos caprichos de um produtor musical.
Nota 6.
Sinopse
Cinebiografia de Neil Bogart, o produtor musical que ajudou a fundar a Casablanca Records. Ele lançou nomes como o Village People, Kiss e Donna Summer ao estrelato.
Ficha Técnica
- Título original: Spinning Gold.
- Origem/Ano: Estados Unidos/2023.
- Direção: Timothy Scott Bogart.
- Roteiro: Timothy Scott Bogart.
- Produção: Brad Bogart, Timothy Scott Bogart, Laurence Mark, Jessica Martins, Gary A. Randall e Chris Torto.
- Fotografia: Byron Werner.
- Montagem: Derek Ambrosi.
- Música: Justin Gray.
- Elenco principal: Caylee Cowan (Farrah Lee), Michelle Monaghan (Beth Weiss), Peyton List (Nancy Weiss), Jason Isaacs (Al Bogatz), Lyndsy Fonseca (Joyce Biawitz), James Wolk (Larry Harris), Dan Fogler (Buck Reingold), Sebastian, Maniscalco (Giorgio Moroder), Jeremy Jordan (Neil Bogart), Winslow Fegley (Young Neil Bogart) e Vincent Pastore (Big Joey).
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Curiosidades
A Era de Ouro estreou nos cinemas dos Estados Unidos em 31 de março de 2023. No Brasil, estreou nos cinemas em 10 de agosto de 2023.